Edição N. 03 - 01/08/2021
Orquestra

Realização FORA DE SÉRIE percursos culturais.

Textos: Antônio Carlos Queiroz, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Miguel Boaventura, Sarah Coelho, Tuty Osório, Ana Karla Dubiela, Jô de Paula, Sérgio Pires.

Fotografia: Celso Oliveira, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques.

Projeto Gráfico e Diagramação: Manuela Marques com consultoria de Fernando Brito.

Ilustrações e Quadrinhos: Manuela Marques, Mário Sanders.

Revisão: Camilla Osório de Castro.

Mídias sociais: Beatriz Lustosa.

Desenvolvimento de Site: Raphael Mirai

 
ALVORADA
Começando a falar de flores

Gratidão, nos guardiões das sinonímias, é um sentimento de regozijo por algo bom que nos aconteceu. Ou por algo ruim que também aconteceu porém nos trouxe aprendizado. Gratidão é também um sentimento de reconhecimento por algo importante que alguém fez por nós. É desta última que quero falar aqui, com muito mel e canela, neste espaço de Boas Vindas aos nossos leitores.

Estamos na terceira edição. E queremos agradecer. Gratidão aos que enviaram mensagens de incentivo, com elogios, críticas e sugestões. Gratidão aos assinantes de primeira hora, que generosamente aderiram ao apoio do Projeto deste Jornal Digital – inspirado nos velhos Jornais que consolidaram a leitura por puro prazer.

Gratidão aos que se incorporaram à equipe, com entusiasmo e dedicação. Gratidão ao passado que nos trouxe até aqui e pelo conhecimento nos faz mais consistentes e fortes. Gratidão ao presente que nos permite este momento.

Domingo à NOITE está ganhando corpo, fazendo tímidas evoluções para melhorar. Nesta terceira edição lançamos a versão em site, desenhado pelo querido Raphael Mirai.

Gratidão ao futuro que não sabemos mas confiamos porque tudo inicia no capinar.

Boas vindas de novo! E que seja longa a vida das boas vindas.

 

NÓS, do Domingo à NOITE em 2021 

HISTÓRIAS DE JORNAL

SALVO PELO O POVO (de domingo!)

O jovem marido gostava das noitadas no bar do Anísio com os camaradas. Coisa inocente, muitas cervejas e o infalível inflamado papo de política. A jovem esposa contrariada em casa, cuidando dos filhos pequenos. Sobrecarregada e privada da boemia, zangava.

Um dia ele chegou de manhã, dia raiado, atravessou o pequeno jardim no passo ingênuo dos ébrios santos, acompanhado de um amigo, com a gorda edição de domingo, recolhida junto ao portão, debaixo do braço.

Ela espumava e ao descobri-lo voou pra cima dele, arrancou-lhe o Jornal e foi surra de O POVO pra valer!

O amigo assistia apavorado, tentando esquivar-se pra não sobrar uma jornalada no próprio lombo. Ou pior, na cabeça… 

Ela investia, com trilha sonora dos xingamentos da esposa ultrajada. Por fim cansou e entrou pros quartos, pra ver as crianças. Ele jogado no sofá, queixava-se da coça jornalística, justo no domingo, quando O POVO vinha mais robusto, com mais conteúdo para o embalo do dia de folga.

 

Ainda assustado, o amigo ponderou – Rapaz, tu teve foi sorte! Imagina se fosse o ESTADÃO? 

TRILHAS

História da nossa coleção. Aguardamos a participação dos leitores, nos trazendo histórias de jornal para enriquecer o acervo e mostrar aqui. Quem preferir pode gravar um áudio e postar no nosso whatsapp ou Instagram.

REPORTAGEM ENSAIO

SONHOS DE OURO, PRATA E BRONZE

Por Miguel Boaventura

Foto: Celso Oliveira

A pátria de chuteiras. Assim Nélson Rodrigues batizou a seleção canarinha, nos anos 50 do XX, cravando a perda do nosso complexo de vira lata. Brasileiros em campo, taquicardia ativada, a autoestima conquistada nos gramados. Sobre quais pisantes se sustentam nossos heróis, heroínas e heroínes de Tóquio 2020?

O balé de Italo sobre as ondas é algo indescritível de belo. Quem não viu, por favor, veja. A pequena Raíssa, a valente Maira do judô, as guerreiras do futebol feminino e Rebeca com seu Baile de Favela. E Bruno da natação, e alguns mais. Nesta Olímpiada bizarra, que leva o nome de um ano e acontece no seguinte, em terras longínquas povoadas pela dignidade oriental e por corona vírus.

Além dos treinos, sagas por patrocínios, superações pessoais e sempre muita perseverança, nossos atletas tiveram que enfrentar os riscos da Covid 19 e as imponderáveis sequelas que dela advêm se com ela se depararem.

Porque o mundo não para. Porém o tem-

 

po, invenção perversa de Chronos, conta em segundos cada conquista. Vibramos na madrugada, torcida leal pelos corajosos atletas. Pulamos, gritamos a cada vitória que aquece a solidão do isolamento.

Cinco dos nossos são motoristas de aplicativo. Representatividade dessa população que cresce a cada instante e só por isso merece uma medalha por dia. Iniciantes e veteranos nos trazendo autoestimas delegadas.

Todos clamam pelo apoio oficial ao esporte. Pelo investimento em vidas, enfim.

TRILHAS

Jogos Olímpicos Tóquio 2020(vídeos na internet e nas Plataformas de Streaming)

Carruagens de Fogo, por Hugh Hudson, 1981

AFETOS

RODAS DO CORAÇÃO

por Tuty Osório

                                    Foto: Celso Oliveira

O tio de Marcinha e de Adriana fez a foto em meados dos anos 70 do XX, e aos 16 anos se descobriu fotógrafo. O piscar do já artista, sobre a alegria brincante, provavelmente num domingo. Dali, Celso Oliveira varou mundo, flagrando gente na lida do trabalho, da folia, da paisagem, do amanhecer e do anoitecer no sertão, na praia, na cidade.

É um andarilho do olhar, parece um pirilampo, iluminando o escuro aos saltos e voos.

Marcinha cresceu alegre, repetindo doces cirandas pela caminhada. Ontem se foi daqui, aos 51 anos, depois de três acidentes vasculares cerebrais. Deixando Maria Aparecida, a mãe, dilacerada. Celso, o tio, imerso numa tristeza sem fim. E tanta gente que a ama, perdida. Perdida nessa estranha visita. Nunca é convidada mas tem chegada certa. Não sabemos quando, nunca; e parece que nunca saberemos lidar com ela. Como dizem, ENCANTADA.

TRILHA

Esta é uma homenagem a Marcinha e ao amor que inspirou aqui na terra. Para lembrar que SOMOS PORQUE SOMOS. Todos juntos, como numa aldeia ancestral. Todos cuidando de todos.

 

CONTO

VOCÊ JÁ FOI AO CINEMA?

Por Tuty Osório

O menino amanheceu num escândalo porque a Netflix não entrava, de jeito nenhum. Adolescente em crise de abstinência da maratona de série diária. A mãe, ocupada com a dissertação de mestrado, desesperava.

-Menino, quando eu tinha a sua idade era matinê no Cine São Luís, no máximo uma vez por semana! E você morrendo por causa de um tempinho sem essas séries! Inferno!

-Mas mãe, você mudou a senha? Qual é a senha?

-Sei lá! Eu vou lá me lembrar? E lá tenho tempo pra isso! Bota aí. Suzanita65, deve ser isso. É a que uso pra tudo, pra não me enrolar.

-Mas mãe, não entra de jeito nenhum! Você trocou o email?

-Jesus, me deixa em paz que tenho que concluir um capítulo hoje! Vai ver que mudei, caiu o cartão e devo ter colocado em outro modo de pagamento. Tenta o email do seu pai.

 

-Mãe, como era o cinema?

-Ah, era bom demais. Uma sala escura, os adultos brigavam quando a gente não fazia silêncio. Na época dos seus avós era programa elegante, os senhores de terno e as senhoras de salto. Tinha até chapelaria para guardar os casacos. E intervalo para um chá no balcão do café do hall.

-Mas mãe, se você não me ajuda a achar o acesso como é que vou contar uma história como essa pros meus filhos?

-Agora você pegou pesado. Falou em memória estou dentro. Vamos lá procurar, eu te ajudo filho.

E largou a dissertação.

(para Camilla Osório de Castro, cineasta do XXI)

TRILHAS

Todos os cinemas do Brasil, Plataformas de Streaming, Canais de TV e Internet que exibem filmes, Acervos, Bibliotecas e Museus de Imagem

ACQ

Rol politicamente pouco correto de escribas que andei conhecendo nos últimos seis meses:

Por Antônio Carlos Queiroz

Ilustração: Manuela Marques

1. Fernande Brassens, 45, pornerótica, três livros publicados, dois no grelo;

 

2. Gláucia Lipase, 37, hipopocondríaca, três  manuais de coaching nutricional;

 

3. Shinkung Schleiermacher, 73, medievalista, restaurador de palimpsestos e comerciante de inseticida antitraças nas horas vagas;

 

4. Aksel Piksel, 29, sete guias impressos e auditáveis para a produção e venda de ebooks;

 

5. Saint-Marceaux Prostate, 55, originário da Nova Caledônia, autor do romance de formação De l’eau froide pour resserrer les blancs de mes œufs en neige;

 

6. Leo Arnaldo Rapadura, 43, porto-riquíssimo depois do bestseller El hombre que amaba al perro del amante de su mujer pero que se escapó con ella.;

 

 

7. Marcos Orkrand, 55, tradutor  do Grande Sertão: Veredas  em língua klingon. Heghlu’meH QaQ jajvam!, diz o Hermógenes.

O BEM VIVER

NOTAS SOBRE O FUTURO

por Camilla Osório de Castro

Foto: Rafaela Sawaki

Não sei como começar este texto. A proposta da coluna é tratar da esperança, das possibilidades de construção de um futuro. Hesito.

Contudo, vou tentar. Vou contar a história do Hugo Teophilo, que acredita que o mundo acabou. Acredita também que isso não é motivo para desistir do futuro. Anos atrás, ele sofria por não haver muitos caminhos para si. Era funcionário de uma grande empresa, trabalhava muito, dormia pouco, comia mal e não via o sol. Estava, segundo ele mesmo, no “sistema penitenciário do mercado de trabalho” e sem saída.

Foi então que o futuro bateu à porta, dali a nove meses uma nova vida habitaria a sua casa, esperava um filho e a noção de que aquela vida escravizada, sem luz e sem cor, seria transmitida a este – que era ainda um vir a ser-, provocou um incômodo irreconciliável. Era necessário mudar.

Anos mais tarde, Hugo está sentado em seu grande quintal, ao ar livre, dando uma entrevista para o documentário Semeando nas Dunas. Ali estava o futuro que começara a ser sonhado quando as portas pareciam totalmente fechadas. Hugo possui hoje uma agrofloresta biodiversa e não produz nenhum resíduo em sua casa. Tudo o que viraria lixo é incorporado pelo ciclo vivo operado por ele em seu quintal. O caminho, ele nos disse, foi olhar para o passado, para o modo de vida de sua avó, de sua bisavó. Elas que tinham plantas, galinhas e uma comunhão com a vida ao seu redor.

Hesitei porque vacilo ao falar do futuro quando o incêndio da Cinemateca Brasileira escancara o nosso descaso criminoso com o passado, com a memória, com tudo aquilo que alicerçou o nosso caminho até aqui.

Hesitei porque eu ia contar sobre um curta-metragem de uma pequena produtora cearense, a minha produtora, e do lindo futuro que se abre a partir das experiências agroecológicas compartilhadas nas entrevistas, para a sua execução. Só que uma parte importante da memória de todos aqueles que vieram antes de mim está destruída. Como eu posso falar do futuro?

Em respeito a esta mesma memória, eu pretendo insistir no otimismo da vontade, inspirada em Gramsci.

Como eu não acredito em soluções individuais, e nem Hugo acredita, concordamos que a construção de um futuro coletivo passa pelo compartilhar de experiências como a dele. E o Semeando nas Dunas é mais uma ação deste compartilhamento.

No futuro, que de teimosa eu insisto em imaginar para poder construir, os pesquisadores acessarão, em uma cinemateca cuidada e preservada, essa história que em forma de imagem e som nós agora escrevemos.

No futuro, teremos sobrevivido para contar a nossa história.

TRILHAS

Semeando nas Dunas : agricultura urbana em Fortaleza

Em finalização

Direção : Rafaela Sawaki e Alisson Severino

Produção: Mar de Fogueirinha Filmes

Projeto Apoiado pelo VIII Edital das Artes de Fortaleza- Lei nº 10.432/2015

ROTEIRO AFETIVO

ÁGUA DE BEBER

Por Francisco Bento

                             Ilustração: Manuela Marques

Parte de vocês talvez se recorde de mim. Encontramo-nos em alguns saraus da CARIRI REVISTA, nos idos de 2013. Sou um carioca de Santa Teresa, apreciador da danada – lembraram? Dela mesma, a cachaça. Aquela que provocou tumulto no Brasil Colônia. Quando foi taxada e proibida com vistas a não atrapalhar o consumo de vinho. Sinceramente, amo vinho, mas a revolta foi justíssima. Estavam discriminando com a branquinha, amarelinha, seja lá qual fosse a cor dela naquela época.

Pois que alcançamos status de bebida rara. Cada dia que passa mais grifes e especialidades surgem pelo Brasil. Industriais e artesanais, envelhecidas em carvalho ou alumínio.

 De norte a sul, cria-se, fabrica-se e bebe-se cachaça. Com mel, especiarias, pura, no cálice ou no copo de geleia. Desta feita, venho só para homenagear. Para a frente contarei peripécias, revelarei personagens, apresentarei segredos.

Uma coisa é certa – na bodega, no boteco, no vidro, no barro e no cristal, é genial essa bebida genuinamente brasileira. Atravessa a nossa História, edifica a nossa cultura e agrada a seda, algodão e gorgorão.

TRILHA

Sertãozim

Endereço: R. Amadeu Furtado, 623 – Parquelândia, Fortaleza – CE

De segunda a sexta 8h a 19h

Sábado de 8h a 17h

TIRINHA

SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA

Manu

CURADORIAS

no Sofá Amarelo

“Uma série de vídeos que apresenta uma nova história a cada episódio.
É a história de um livro pelo melhor olhar possível: o de seu leitor.
Um sofá num cenário que não se produz, não se cria,
mas se capta em toda a sua realidade. A mesma realidade
que a história ou a ficção cria em quem lê.”

CREPÚSCULO

NAVEGADORES ANTIGOS

                                  Foto: Celso Oliveira

Julho despediu-se com uma dádiva. Pensem numa notícia boa. A reabertura do Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, depois de anos se recuperando do incêndio que o interditou em 2015.

A volta do espaço abrigado na histórica Estação da Luz foi prestigiada pelo presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Souza, pelo presidente de Cabo Verde Jorge Carlos Fonseca, entre outros representantes dos países lusófonos – são 260 milhões de seres, os que falam português, espalhados pelo mundo.

Com diferentes sotaques, é a língua da unidade em diversas culturas, nos cinco continentes. Um rastro do bem, em meio a tantas marcas de horror, espalhadas pela peregrinação das caravelas.

O que fala, lê e escreve em português. Brasileiro, moçambicano, angolano, cabo verdiano, guineense, macaense, santomense, timorense. Mais os nascidos nesses países, em diáspora como imigrantes. Uma imensa comunidade em sintonia.

Tuty e Trupe