Edição N. 11 - 26/09/2021
Orquestra

Realização FORA DE SÉRIE percursos culturais.

Textos: Antônio Carlos Queiroz, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Miguel Boaventura, Sarah Coelho, Tuty Osório,  Jô de Paula, Sérgio Pires, Francisco Bento, Renato Lui, Marta Viana.

Fotografia: Celso Oliveira, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Fernando Carvalho

Projeto Gráfico e Diagramação: Manuela Marques com consultoria de Fernando Brito.

Ilustrações e Quadrinhos: Manuela Marques, Mário Sanders, Alice Bittencourt.

Revisão: Camilla Osório de Castro.

Mídias sociais: Beatriz Lustosa.

Desenvolvimento de Site: Raphael Mirai.

 
ALVORADA

PORQUE EXISTE CARTOLA

Em entrevista a Silvio Almeida, Lázaro Ramos diz que uma música de Cartola é maior do que qualquer mal. E que o Brasil é Cartola, é maior que as ameaças, que o desespero, a burrice e a insensatez. Lázaro tem razão. É triste ler os amigos que à distância dizem ter desistido do Brasil. Não é trocando de terra que se passará a ser mais feliz. É lutando por esta terra aqui. Todos os dias. Ancorados nas rosas que o nosso perfume exalam. Ainda é cedo. Mal começamos. Não vamos anunciar a hora da partida. Nosso rumo é aqui.

Obrigada Brasil. Por tudo o que me deste.

 

NÓS juntos, criadores e leitores, do Domingo à NOITE em 2021

ACQ

Hegel na cozinha

foto: Arquivo

No óleo e sal dessa panela

a coisa em si sufoca e pela

e sua pele logo espoca –

 

Sem mais saída a talecoisa

expressa-se ensimesmada

até negar-se pelo avesso –

 

Em loucas piruetas

o grão que era amarelo

– tirante os piruás –

é já – branca pipoca!

 

REPORTAGEM ENSAIO

O PRÓXIMO DIFERENTE

por Miguel Boaventura

foto: Celso Oliveira

Não gosto de datas. Dia disto, dia daquilo. Acho que já falei disso aqui. Todavia, ultimamente tenho prestado atenção em algumas delas. Semana passada, a 21 de setembro, ouvi algumas entrevistas na rádio sobre o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência.

 

Uma delas falava que não querem mais ser tratadas como pessoas assistidas. Mas, sim, como protagonistas. Serem debatedoras e autoras das leis e normas que tratam da sua inclusão e participação mais igualitária na sociedade.

 

Não fosse esse dia 21 instituído e eu não teria sido provocado a pensar nesse assunto. E não estaria repercutindo o tema nestas linhas do Domingo. Portador  da mais absoluta, dita, normalidade, não suporto uma dor no pescoço sem tomar um relaxante muscular.

 

Minha lamentável deficiência é não perceber o Outro que ao meu lado debate-se com as limitações de um mundo que não o reconhece. Sequer o vê.

 

No concreto e também simbolicamente é preciso inundar o mundo de rampas, áudios, língua de sinais, elevadores, passagens largas. Não pelas estatísticas, que nos mostram quase 40% de pessoas com deficiência em todo o mundo. Mas porque mesmo que fosse uma só já se justificaria ser levada em conta.

 

O padrão é desprezível em qualquer referência. A bússola da vida é a diversidade e sua mágica verdade de contrastes.

 

TRILHAS

Filhos do Silêncio (filme), por Randa Haines, 1986

CONTO

ÁGUA MOLE QUE NÃO BATE

por Tuty Osório

foto: Fernando "Azul" Carvalho

-Menina arruma o quarto, recolhe as roupas do chão, organiza o banheiro, recolhe os copos, vê se a cachorra e a gata têm água…

-Tá certo mãe…

-Todo o dia isso! Anda filha, quase meio dia, você fica enrolando…

-Mas mãe já vou, sério…Não precisa você se irritar…

-Não tem como não me irritar. Dizia uma amiga minha que educar é repetir mas sinceramente estou perdendo a energia…

-Que exagero mãe! Eu vou arrumar, estou só terminando aqui de responder uma mensagem…

-Larga esse celular, agora! Vai fazer as coisas que eu te pedi!

-Mas mãe, já tô indo! Que saco!

-Também acho! Você me vence porque chega uma hora que nem eu aguento mais me ouvir! Padecer, a gente padece, só não encontrei até hoje o tal do paraíso!

-Afffe mãe, vou ficar traumatizada com essa rejeição, viu?

-Larga de conversa fiada e vai cuidar, vai cuidar!!!

CRÔNICA

O ESSENCIAL COMO COTIDIANO

Por Tuty Osório

foto: Fernando "Azul" Carvalho

“Longos dias têm cem anos. Assim me diziam quando se tratava de protelar um assunto, de o fazer amadurecer na lânguida separação do inadiável. E os longos dias passavam carregados de justo sentimento pelas coisas que devíamos fazer de maneira lesta e durável. Às vezes não se faziam nunca.

 

Outros planos, mudanças, resistências, vazios súbitos do coração, que é quem nos comanda o trabalho e a fantasia. Longos dias têm cem anos. Era uma admoestação e uma ironia para o preguiçoso inveterado que num século acha tempo adequado para os seus projetos, e a combinação laboriosa que os acabe.

 

Mas eu, como um frade no seu horto, acordo sempre a horas e retomo a palavra que tinha começado muitos anos antes.”

 

A maravilha acima pertence ao longo primeiro parágrafo da obra que Agustina Bessa Luís dedicou à amiga Maria Helena Vieira da Silva, artista visual atuante nos rebeldes anos 60, do XX.  A escritora portuguesa enleva-nos numa descrição de Vieira da Silva em forma de bordado de letras. De uma beleza comovente e mobilizadora de todos os nossos sentidos. Os sensoriais e os da vida.

 

E eu, aprendiz das palavras desenhadas, tento bordar um conjunto de contos também dedicados a amigas que me marcaram, companheiras de jornada que nunca soltam a minha mão. Em breve sobrevoarão algumas tardes e noite de estrelada leitura.

  • Fádua e os Sentidos da Vida, por Tuty Osório, em elaboração
  • Longos Dias têm cem anos, por Agustina Bessa Luís, Guimarães Editores, 2016
O BEM VIVER

DE UM EM UM SOMOS MUITOS

por Camilla Osório de Castro

foto: Adobe Stock

Hoje vamos falar de soluções individuais. Nesta coluna, focamos muito nas lutas coletivas e nas soluções comunitárias para nossos problemas estruturais. Há, no entanto um problema de TODOS que pode ter uma solução individual, em certa medida, e onde temos um certo poder de ação em prol do nosso bem estar e da nossa saúde – a alimentação.

 

Devo alertar que eu não estou defendendo aqui que a ação individual é capaz de solucionar os problemas de segurança alimentar e a fome.

 

Contudo, vivemos tempos em que o indivíduo manter-se física e mentalmente são constitui-se, sim, em ato de coragem e rebeldia.

 

É provável que você já conheça o vilão da nossa história: os ultra processados. E que você tenha visto as notícias sobre a Coca-Cola considerar o Guia Alimentar para a população brasileira uma ameaça para a corporação. 

 

É provável que você já tenha tido contato com o guia e saiba que quanto mais natural for o alimento, mais saudável. Que miojo e salgadinho faz mal, assim como refrigerante e refresco em pó. 

 

A minha pergunta é: você sabe identificar os ultra processados na prateleira do supermercado? Você considera listas de ingredientes quando vai fazer compras? Você sabia que a mesma marca oferece o mesmo produto em versões mais processadas e menos processadas sem apontar de forma clara essa diferença? 

 

Tomemos como exemplo o leite e seus derivados, queijos, coalhadas, iogurtes, creme de leite, etc. O produto in natura é o leite acabado de sair da vaca. A pasteurização do leite para a sua conservação e os processos de fermentação para produzir os derivados constituem-se em processamentos mínimos, ainda completamente dentro do escopo do que podemos considerar saudável em termos de processamento de alimentos. 

 

No entanto, os produtos encontrados à venda, em especial aqueles com selos “light” e “diet”, que possuem menos gordura ou açúcar, são adicionados de uma série de químicos que os distanciam cada vez mais da categoria alimento.

 

No caso dos “light” e “diet”, isso ocorre principalmente para substituir a consistência e o sabor dados aos alimentos pelo açúcar e pela gordura. Compramos esse produtos acreditando que estamos consumindo algo mais saudável, quando na verdade sequer sabemos o que estamos ingerindo e como essas substâncias se comportam no nosso organismo. 

 

A boa notícia é que nesse caso, para quem possui renda o suficiente para escolher o que vai comer, a solução é bem simples: leia os rótulos.

 

Se está escrito algo que você não sabe o que é, sinal de processamento excessivo e aditivos excessivos.

 

Se couber na sua rotina, opte pelas comidas que estragam mais rápido. Mais comida e menos plástico.

 

E se você puder, faça pressão. 

As grandes indústrias de alimentos só eliminarão os ultra processados se eles deixarem de ser rentáveis, ou seja, se não forem consumidos.

 

Porque apesar dos parênteses abertos aqui neste texto, a mudança será sempre fruto de uma luta coletiva.

TRILHAS

Guia Alimentar para a população brasileira, disponível em:  https://guiaalimentar.org.br/

 

Desrotulando, aplicativo para te ajudar a fazer escolhas mais saudáveis de acordo com os rótulos dos alimentos, disponível gratuitamente para download em android e ios

BACHIANAS E COMPANHIA

ACOLHIMENTO QUE SALVA

Francisco Bento

encontrado em: Trip Advisor

Pois é, como dizia a avó de Tuty Osório, a ração não é de quem se destina mas de quem a merece. Assim aconteceu este sábado. Eu havia convidado o Sérgio Pires para um chouriço artesanal com Bagaceira Velha na minha casa de Santa Teresa, no Rio. E uma ida a Brasília para a retomada de um projeto gastronômico inverteu a situação. Fui recebido em grande estilo, por Sérgio e sua esposa Eliana, com comida e bebida da maior qualidade. Mas o melhor de tudo foi o tempero do afeto, transferindo a mim em honra de Tuty, velha amiga deles.

 

As entradas versaram sobre a comida árabe. Pasta de grão de bico, o vulgo Humus Tarrine, queijo Chantriche ralado com salsa e tomate, finas fatias de pão sírio.

 

Com espumante rosé e branco. Muito seco e muito maravilhoso.

 

Eliana, Lili para os próximos, é mineira e cozinha divinamente todas as nacionalidades. Pra glória minha, fã da cozinha de Minas, o sábado foi de pernil com limão e alho, feijão tropeiro, farofa de farinha de milho. Tudo regado por um tinto português harmonizado com galante simplicidade pelos auspícios de Sommelier do Serginho.

 

Estou cheio de liberdades, depois que fui distinguido com esse convite reservado somente aos amigos muito íntimos.

 

Foi tudo perfeito. A comida, as bebidas, a alegria, as conversas. As filhas, os genros, os netos e netas do casal estavam presentes, além da mãe e de amigas queridas.

 

O que mais me encantou e que é o melhor tempero foi a acolhida. O afeto. O brilho nos olhos e nas gargalhadas de todos e todas.

 

Obrigada Sérgio Pires e Eliana Santana. Por me lembrarem como é bom ter amigos. Eu achei que tinha adormecido essa emoção. E recordei tudo.

TIRINHA

SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA

CREPÚSCULO

VERÃO QUE AMA O INVERNO

Hoje o crepúsculo será a esperança que as tardes vermelhas nos trazem. Outono num plano. Primavera no outro. Setembro sempre é colorido, suave, tal qual orquidário em deserto. Um domingo com gritos de crianças, risos de adultos de todas as idades. Um domingo como deve ser. Doce e cálido como as cores de Frida.

 

 

Obrigada por estarem com a gente até aqui.

Tuty e Trupe