Edição N. 18 - 14/11/2021
Orquestra

Realização FORA DE SÉRIE percursos culturais.

Edição Geral: Tuty Osório

Textos: Antônio Carlos Queiroz, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Miguel Boaventura, Sarah Coelho, Tuty Osório,  Jô de Paula, Sérgio Pires, Francisco Bento, Renato Lui, Marta Viana, Alim Amina, Lia Raposo

Fotografia: Celso Oliveira, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Fernando Carvalho

Edição de Fotografia: Manuela Marques 

Projeto Gráfico e Diagramação: Manuela Marques com consultoria de Fernando Brito.

Ilustrações e Quadrinhos: Manuela Marques, Mário Sanders, Alice Bittencourt.

Revisão: Camilla Osório de Castro.

Mídias sociais: Beatriz Lustosa.

Desenvolvimento de Site: Raphael Mirai.

 
ALVORADA

SOMOS UM COLETIVO

foto: Tuty Osório

O Domingo à NOITE em 2021 está agregando gente, gente. Que apoia, lê e participa. Agradeço ao Maurício e à Christiane, que compartilharam aqui seus talentos. Hoje veio o Caio, para cantar com a Manuela, um presente. Emocionada. Grata. Como diz meu querido amigo Marcílio Alves Pereira, Gracias a la vida que me há dado tanto!

Começa agora mais um Domingo à NOITE em 2021! 

ACQ

por Antônio Carlos Queiroz

Cecília Meireles (7/11/1901-9/11/1964)
REPORTAGEM ENSAIO

ELEGIA

por Miguel Boaventura

foto: Celso Oliveira

 

“Poetas e mendigos, músicos e profetas, guerreiros e canalhas, todas as criaturas desta indomável realidade, temos pedido muito pouco da imaginação, porque nosso problema crucial tem sido a falta de meios concretos para tornar nossas vidas mais reais. Este, meus amigos, é o cerne da nossa solidão.”

 

Gabriel García Marquez

 

Pois é. Há momentos em que ficção e realidade se confundem num baile de máscaras. Tuty Osório diz-me sempre que confia mais na ficção. É uma romântica, por vezes desvairada. Eu sou pragmático, não um pessimista, mas procuro ver as coisas como são.

 

Os estudiosos da semiótica, o discurso sobre os significados das palavras e das coisas, afirmam que o acesso à realidade exata é impossível. O que vemos é sempre mediado – como que traduzido – pelos filtros do nosso olhar e das nossas experiências. Conscientes e inconscientes. A acreditar neles, nosso realismo não passa, mesmo, de ilusão. Ou de uma foto operada por equipamentos e artistas de talentos e qualidades variadas. Quanto menos sabedoria, mais riscos de fotos ruins, embora com pretensão a magníficas.

 

Wagner Moura repete em suas entrevistas sobre sua estreia como diretor, que fez um Mariguella complexo. Considero válido, o argumento, e tenho muita simpatia por esse ator, produtor, cantor no lazer, e agora diretor – sempre com imensa sinceridade, determinação, esforço. Só que é uma obviedade que me choca ser recebida como novidade.

 

É fato, real ou ficcionado em existência concreta, que temos sido vítimas de nosso insistente reducionismo. Nada é simples. Por isso existe arte, memória, imaginação que luta – aos gritos e em silêncio.

 

TRILHAS

 

Mariguella, (filme), por Wagner Moura, com Seu Jorge e outros artistas incríveis

Crônica de uma morte anunciada, (livro), por Gabriel García Márquez

MÚSICA talentos aos domingos

OBA, LÁ VEM ELA

Por Manu e Caio

De Jorge Ben Jor, essa música marcou a geração nascida nos anos 60 e habita a alegria das gerações a seguir. Eu e Caio, com 17, gostamos e quisemos mostrar e homenagear o Ben, hoje com 82 anos.

CONTO

CANDURAS CANALHAS

por Tuty Osório

foto: Fernando Carvalho

– Mãe…

– Pode falar. Estou ouvindo com toda a atenção.

– Você sempre me dá atenção. Por que a ênfase?

– Menina, é que tô cansada do povo que não escuta, não lê direito as mensagens, pergunta cinquenta vezes a mesma coisa…

– Pôxa mãe, eu sei que eu sou dispersa, mas tô me esforçando…

– Não é você. Você é adolescente e está na fase de treino. Estou falando de adultos que só se ligam em vídeos, memes, piadinhas, correntes de pânico…

– Sei. Tipo a humanidade no limiar entre a infância e a adolescência?

– Tipo isso. Perdeu o encanto de ser criança e não ganhou a curiosidade do desafio. Além de zero sabedoria de amadurecer…

– Vixe mamãe. Não sobra ninguém?

– Também não é assim. Não dramatiza!

-Eu???? Você que cortou minha conversa com esse existencialismo do inferno outral

Ou o quê?

-Dos outros, mãe. Os outros que são o inferno, e tals… Que nem dizia aquele francês marido da Beauvoir. Tá ligada?

-Tô…e tá tão difícil que nem o Paraíso do Valter Hugo Mãe ganha a minha alma triste, hoje…

 

TRILHAS

 

A náusea, (livro), por Jean Paul Sartre

 

O Paraíso são os outros, (livro), por Valter Hugo Mãe

HISTÓRIAS DE HISTÓRIAS

LIRISMO INVERNAL

Por Lia Raposo

Para mim também as casas são velhas amigas. Quando passeio, cada uma delas parece correr ao meu encontro na rua: olha-me com todas as suas janelas dizendo-me algo como isto: “Bom dia, como estás? Eu vou bem, graças a Deus, muito obrigada! Em maio vão- me aumentar um andar.” Ou: “Como vais? Amanhã vou entrar em obras.” Ou: “Estive quase a arder e tive bastante medo.” E outras coisas semelhantes.

(…)

Nunca esquecerei a história de uma linda e pequena casa cor de rosa – claro. Era uma casinha de pedra, olhava-me com um ar tão afável, e olhava tão orgulhosamente as suas frias vizinhas, que meu coração se alegrava sempre que passava diante dela. Subitamente, na semana passada, ia a passar na rua, olhei para a minha amiga e que ouço eu. Um grito dilacerante: “Pintaram-me de amarelo!” Malandros! Bárbaros!

(…)

Por aqui já se vê, amigo leitor, como tenho relações com toda a São Petersburgo.

Fiódor Dostoiévski, in NOITES BRANCAS

Navegando no Instagram do Sebinho, em busca das leituras e sugestões a propósito do bicentenário de nascimento do monumental Dostoiévski, deparei-me com este lindo trecho lido por Cida, uma das proprietárias da maravilhosa livraria/bistrô/centro cultural de Brasília.

Foi a inspiração para lembrar este conto longo, menos conhecido, do autor russo do século XIX, expoente do romance psicológico e considerado um precursor do modernismo na literatura.

Noites Brancas foi publicado pela primeira vez em 1848 e na contemporaneidade recebeu diversas adaptações cinematográficas. Por Luchino Visconti, Le notti bianche, Ivan Pyryev, Belye nochi, Robert Bresson, Four Nights of a Dreamer, James Gray, Two Lovers, são algumas expressões da transposição para o cinema.

Como muitas das histórias de Fiódor, Noites Brancas é narrada em primeira pessoa por um personagem sem nome, que vive sozinho na cidade e sofre por causa da solidão e por não conseguir parar de pensar.

 

É o arquétipo do sonhador perpétuo. Sozinho, vive dentro de seus pensamentos, imaginando que um velho homem por quem ele sempre passa, mas nunca conversa, ou as casas, são seus únicos amigos. O conto é dividido em seis partes: Primeira Noite, Segunda Noite, História de Nastenka, Terceira Noite, Quarta Noite e Manhã.

São as experiências ao caminhar pelas ruas de São Petersburgo. O narrador gosta de andar durante a noite, pois é o horário em que se sente mais confortável. Não gosta do dia porque as pessoas que ele costumava ver não estão nos mesmos lugares.

Tirava suas emoções delas, se elas estavam felizes, ele também ficava feliz, se elas estavam desanimadas, ele ficava também, por isso, ele se sentia sozinho ao ver novas pessoas. Conhece bem, e as trata como gente, as casas dos arredores, notando, em cada uma de suas caminhadas, uma pintura nova ou algo que foi alterado nas construções.

Tristeza, alegria, melancolia e entusiasmo, é mais um texto com a comovente marca do relator dos subterrâneos mundos da cidade e da alma.

FONTE

Site InfoEscola

TRILHAS

Noites Brancas (livros e filmes)

Toda a obra de Dostoiéviski (livros),obra completa relançada recentemente no Brasil pela Editora 34, assinalando os 200 anos de nascimento do autor.

O BEM VIVER

CSA – IDENTIDADE E MOTIVAÇÃO

por Camilla Osório de Castro

Camilla, Tânia, Silvano e Luna. Acervo pessoal

Em 2019, morei em Brasília onde entrei em contato com o conceito de CSA- Comunidade que Sustenta a Agricultura.

 

Fazer parte da CSA Paulo Freire mudou o meu bem estar com a alimentação. Saber quem produz a sua comida e estabelecer uma relação economicamente justa e também de amizade com essas pessoas, ajudar a produzir, conhecer o tempo de cada planta… Tudo isso me permitiu lidar com o alimento, não mais como um produto que eu consumo, mas, sim, como um elemento que me nutre, o corpo e a alma.

 

Uma CSA é formada por um braço no campo e outro na cidade que, juntos, viabilizam a sustentabilidade de uma relação livre de exploração na produção de alimentos.

 

Uma família de agricultores, no caso da Paulo Freire Tânia e Silvano, produz alimentos orgânicos em um pequeno lote com capacidade para atender um pequeno grupo, em torno de 30 Co-agricultores.

 

Cada Co-agricultor entra com uma cota e também com alguma função no coletivo – controlar as finanças da CSA, fazer o acolhimento dos novos Co- agricultores, cuidar das redes sociais, etc.

 

O valor das cotas é definido coletivamente de modo que os agricultores ganhem um salário digno e possam manter as despesas do cultivo da horta, no caso da CSA Paulo Freire, uma agrofloresta.

 

Deste modo, não há o conceito de lucro ou troca comercial. É uma parceria entre quem produz e quem consome.

 

Uma vez por mês, antes da pandemia, havia mutirões em que toda a comunidade plantava e colhia.

 

Aprendi técnicas de plantio, aprendi a reconhecer sementes, reaprendi a mexer na terra, seu cheiro e sua textura.  Após o mutirão, preparávamos um almoço coletivo. A comunidade era formada por pessoas de todas as idades e profissões, fui aprendendo um pouquinho com cada um, de tudo um pouco, a cada encontro algo novo.

 

Nesse período eu fazia um curso aos sábados pela manhã e ia logo após a retirada da minha cesta semanal de frutas, legumes e verduras.

 

Chegava à aula com a cesta na mão e ouvia comumente duas perguntas: “onde você compra essas verduras?” e “o que é essa plantinha?”. A segunda pergunta normalmente referindo-se às PANC, Plantas Alimentícias Não Convencionais, que abundavam em minhas cestas e, por não serem vendidas em supermercados, não são muito conhecidas pelo público urbano.

 

Eu gostava de contar o que vinha aprendendo sobre as PANC, seus sabores, valores nutricionais e receitas.

 

A comunicação enganchava quando eu tentava explicar que eu não comprava a cesta e sim compunha uma comunidade que produzia essa cesta sem relações mercantis.

 

A maioria das pessoas a quem respondi essa pergunta saíram de nossa conversa sem entender o que era uma CSA e qual era a diferença para uma cesta orgânica comprada no mercadinho. Muitas, ainda, me questionavam a falta de comodidade de não saber o que viria na cesta naquela semana. Respeitar o tempo da natureza e fazer as colheitas conforme os ciclos não é cômodo mesmo, mas não era por isso que eu estava ali.

 

Por que, então, uma CSA? Porque o modo que produzimos alimentos hoje no mundo está nos envenenando, erodindo nosso solo, alienando nossos conhecimentos sobre os alimentos e escravizando os trabalhadores rurais.

 

Porque em comunidade somos mais autônomos, mais saudáveis e mais fortes.

ROTEIRO AFETIVO

Participante do evento de Ambientação, Casa Cor, há muitos anos, a arquiteta Christiane Boris conta-nos da emoção de integrar o evento na casa onde cresceu e casou, erguida por seus pais na década de 70. O avô de Christiane veio para o Brasil no início do século XX, unir-se aos familiares que aqui haviam iniciado atividades de exportação em 1870. De presença marcante no Nordeste brasileiro, as Casas Boris são parte importante da história de Fortaleza e da atividade comercial envolvendo expansão de Portos de Mar, até hoje.

 

Christiane seguiu um caminho seu, como arquiteta de interiores e ativista da gentileza urbana.

CORES E NOMES DA CASA

Por Christiane Boris

“Acompanhei todas as etapas dessa casa. Do sonho do meu pai tirado de uma casa de campo francesa, ultra moderna, toda em pedra e vidro, à concepção do projeto pelo arquiteto Reginaldo Rangel e por fim a obra. Desde as escavações dos alicerces até às telhas escondidas pela platibanda de concreto armado.

 

Ficamos alguns anos sem ter os móveis da sala de estar. Mas a boate/bar ficou logo pronta. Nos anos 70 toda casa tinha um espaço desses. Com um pai festeiro e uma mãe acolhedora, não tinha como não tê-lo.

 

E o jardim? Qual deles? Minha mãe adorava plantas. Samambaias, palmeiras, tamareiras, espada de São Jorge, jiboias, costelas de Adão. Jardim de inverno eram 3: no estar, no jantar e no banheiro do casal.

O jardim de externo e o primeiro e único jardim de rua da aldeota, o que chamam de gentileza urbana, recebeu do CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil) uma menção honrosa. Era para ter sido primeiro lugar.

 

Aos onze anos me tornei arquiteta. Era o que eu queria ser, vendo a arte da edificação acontecer bem na minha frente como um lindo parque de diversão.

 

Na infância, gostava de desenhar no meu caderno escolar paisagens com casinhas, figuras humanas e animais. Flores.

 

Depois dessa empreitada de modernismo passei a gostar das linhas retas, das paredes de pedras, dos panos de vidro e da madeira natural.

 

Tenho no sangue o respeito e a admiração pela natureza. Vem de família.

 

Fazer essa Casa Cor parecia ser fácil, só no início. Ah como a transformação do que você queria sempre intacto mexe com seu subconsciente e desce pela garganta até revirar o estômago.

 

Ter autocontrole, para quem tem emoção na pele não é fácil.

 

Casa Cor é uma exposição de projetos e talentos profissionais que deve ser mostrada, mantendo a essência original da Casa que a abriga. Sim, nenhuma árvore pode ser tirada, elas são, pra mim, santuários dos meus pais, dos soins e das aves que ali rodeiam.

Durante as mudanças e em meio a obra, perdi o sono. Normal em Casa Cor, ainda mais em época de pandemia e crise econômica. Pense!

 

Cheguei a sonhar várias vezes com meus pais me dizendo para trazer os sofás originais da sala, que as pessoas estavam chegando, não ia dar tempo.

 

Sonhei com meu filho e sobrinho nadando na piscina e eu dizendo: nadem bastante e divirtam-se, amanhã não tem mais. Nossa! Graças a Deus faço terapia na linha humanista fenomenológica. Não somos os mesmos de ontem, estamos sempre em mudança. Porém a essência, a raiz, não muda.”

O ambiente que coube a Christiane nesta edição da Casa Cor, foi, justamente a sala de estar que só recebeu decoração depois de já morarem há tempos na casa.

 

Assim a arquiteta descreve a sua criação:

 

ESTAR BEM

 

Lugar de receber a família e os amigos, de confraternizar e comemorar a vida. 

 

Onde a atmosfera deve ser de harmonia e alegria.

 

Criei esse espaço sob a luz desse momento de Pandemia que vivemos e que ainda estamos aprendendo lidar. Uma peste, por que não dizer, que ceifou a vida de muitas pessoas, conhecidas e desconhecidas. Nos deixou assolados pelo medo do desconhecido, mortal. Tudo isso nos levou a refletir e a buscar conforto nos mistérios de Deus. Não só os cristãos católicos, evangélicos, judeus, espíritas, budistas. Até os agnósticos passaram a pensar que a oração era necessária para acalmar nossos corações.

 

Surgiu a ideia de ter na sala o oratório como ponto de partida, que foi dado a minha mãe, sendo a mais católica da família Montenegro. Oratório que está na quinta geração da família. Um resgate da memória, história e da fé católica.

 

O jardim de inverno na sala conecta-se ao jardim externo por uma grade desenhada por meu pai. Revitalizei esse recanto com um espelho d’água e uma rede como lugar de relax. Além da belíssima escultura de Sérvulo Esmeraldo, “La femme bateau”.

 

Entrando na sala à direita, temos uma mesa lateral com uma árvore desidratada, um lindo sofá de couro laranja, ambos da Amora Casa. Em seguida uma mesa esculpida em pedra da loja Ouvidor e dois banquinhos da Amora Casa.

 

Sobre a mesa dois pendentes (lustres) Tulipa em cristal de vidro soprado com assinatura de Cristiane Bertolucci, assim com o pequeno abajur Lichia, ambos fornecidos pela Spot iluminação.

 

Na parede de pedra um díptico do artista Jose Guedes. Prato da Galpão Details.

 

A mesa de centro, feita de uma adega antiga, também da nossa família,  está sobre o tapete cinza da Bete Cunha Tapetes.

 

TRILHA

 

Christiane Boris é apoiadora e leitora do Domingo à NOITE desde a primeira hora. Arquiteta há 26 anos, gosta de tudo que está ligado ao modernismo. Valoriza a arte e os móveis de família que tenham beleza e história. Harmoniza os seus conceitos de design e arquitetura ao jeito de ser de quem busca os seus projetos, numa simbiose de personalidade.

 

Instagram: @christianeboris.arquitetura

BACHIANAS E COMPANHIA

CUBA LIBRE

Sérgio Pires

Dentre os coquetéis vindos de Cuba, o Mojito e o Daiquiri, junto com o Cuba Libre estão entre os mais conhecidos, sendo que este último está gravado na minha memória. Foi o responsável pela minha Iniciação Alcoólica.

O Cuba Libre tem diferentes nomes em diferentes países. Na Espanha, é chamado de Cubata, no Chile é o obvio Roncola, rum com coca. No México, apenas “Cuba”. Os que falam inglês o chamam de “rum and coke”.

Em Miami, onde hoje residem milhares de cubanos exilados anticastristas, o coquetel Cuba Libre é chamado nos cardápios de alguns restaurantes com o nome de “Mentirita”. Será verdad?

A história mais divulgada sobre a origem da receita do coquetel e do seu batizado com o nome de Cuba Libre remonta à Guerra Hispano-Americana de 1898, pela independência de Cuba em relação à Espanha.

Os EUA participaram desta guerra com o envio de soldados para ajudar Cuba a obter a sua emancipação.

Aí, reza a lenda, que um oficial americano, o Capitão Russell, em um dos bares de Havana, misturou Coca-Cola ao rum e fez um brinde ao final da guerra. Alguém teria perguntado o nome do coquetel e outra pessoa teria respondido “Viva Cuba Libre!”

A história é tão redondinha que até uma testemunha, que teria estado presente neste momento, décadas depois, jurou perante um juiz que foi assim que tudo aconteceu. Por coincidência ele trabalhava em uma fábrica de rum.

Mas os fatos contrariam a lenda de 1898. Neste ano a Coca-Cola ainda não havia chegado em Cuba, o que só aconteceu em 1900.

O Capitão Russell voltou para os EUA ainda em 1898. Será que o Exército Americano tinha o seu estoque próprio de refrigerante? Parece mesmo que é mais uma história de apropriação cultural.

Alguns historiadores afirmam que já antes de 1868 existia na ilha caribenha um coquetel com o nome de Cuba Libre, que era elaborado com mel, água, rum e limão. Vale lembrar que na época a Coca-Cola levava mel na sua composição.

E afinal, qual é a receita do Cuba Libre?

Simples. É só misturar em um copo longo com gelo, 60 ml de rum branco, espremer uma fatia de limão e completar com Coca-Cola. Alguns bartenders sugerem beber com um canudo.

Não sei como funcionava, mas nós, todos adolescentes, ficávamos informados sobre festas em todo o Rio de Janeiro. Todo Rio de Janeiro deve ser compreendido como sendo alguns bairros da Zona Sul.

Festa de 15 anos……… de menina ……… com convite……., era irresistível, só tínhamos de superar alguns pequenos detalhes logísticos, algo assim do tipo, dispormos de apenas um convite individual para o nosso grupo de cinco marmanjos.

E deu-se o milagre da reprodução dos convites, graças à recém lançada tecnologia da xerox, que só existia no centro da cidade. Nosso cúmplice, acredito que involuntário, foi o pai de um dos colegas, fizemos até uma montagem para trocar a numeração. Pensávamos em tudo.

Era um golpe de mestre, o crime perfeito, totalmente à prova de falhas, não havia como dar zebra.

Todos nós estávamos nervosos, mas confiantes, armados de coragem e empunhando os convites como um escudo protetor.

Tocamos a campainha do duplex, num prédio de luxo na Gávea. A porta se abriu, um rapaz e uma senhora surgiram  e… (poderia ter uma música de suspense como fundo musical).

Um vento fino e gelado (vindo de nossa imaginação) percorreu nossas espinhas, congelou nossas almas e o nervosismo pressionou nossas gargantas. Durante o planejamento, com todos os passos milimetricamente calculados, prevíramos tudo, absolutamente tudo, menos que na porta da festa haveria uma lista com os números dos convites e os respectivos nomes dos convidados.

Um detalhe, sempre há um detalhe, que ainda não revelei, não por omissão, mas apenas por aguardar um instante mais dramático, o convite genuíno era azul.

– Pera lá! – poderão dizer alguns, senão todos – Qual é o drama em o convite ser azul?

Ah! Os modernetes! Geração das impressoras e cópias coloridas. Naqueles tempos das cópias com stencil em mimeógrafo a álcool, as Xerox coloridas eram coisa de ficção científica, ou seja, nossos convites eram em preto e branco.

Começamos, um a um, a estendê-los ao rapaz munido de uma prancheta com a tal lista. Este, com uma caneta na mão, procura pelo número para checar.

– Não entendo. Seu convite tem número par. – e passava as folhas da lista de lá para cá, tendo a senhora tentando ler por cima de seu ombro.

– Sim, é par. – procurávamos falar o menos possível para não nos complicarmos mais ainda.

– Número par é só para os convites das meninas. – Susto geral. O que se pode fazer? Agora, o negócio era culpar alguém.

– Foi fulana que me entregou. Já recebi desse jeito. – A fulana era a amiga da aniversariante que sabíamos haver ajudado na preparação da festa. A responsável pelo nosso único convite verdadeiro (sem aspas).

Por falar em convite verdadeiro, o feliz detentor deste único e raro exemplar, já estava lá dentro, havíamos combinado dele entrar na frente. E lá estava ele fingindo que não nos conhecia. Mas era para ser assim mesmo, a esta altura do campeonato, a solidariedade era a nossa com ele.

O golpe da culpa funcionou, a Senhora que nos recepcionava assumiu o comando e decretou: – Fulana é muito atrapalhada, a lista está toda errada. Podem entrar. – Alívio. – Engraçado. Este convite de vocês ….. – Suspense! – Parece meio diferente. A cor …. – Pânico! – Deve ser por causa da luz negra. – Corremos para dentro.

Ficamos na maior excitação, júbilo, sede e fome. O garçom (é, tinha garçom) me ofereceu uma Cuba-Libre. Parecia só que a Coca-Cola tinha um sabor um pouco diferente.  Com a garganta seca pelo nervosismo, tomei o copo todo num instante.                   

 Engraçado como, de repente, tudo passou a ficar mais engraçado e divertido e engraçado e divertido.  Peguei outra Cuba.

Já sabíamos, a esta altura (sacaram o uso ambivalente do vocábulo?), que a tal Sra. lá da porta era a mãe da aniversariante, daí que quando ela me procurou para falar comigo, quase que abalou a minha sensação de confiança de que tudo já estava resolvido.

– Estive te observando… – O quê?!!! Ela está me observando. – Você é o mais velho aqui na festa. – Concordei, fazendo cara de mais velho. – O mais responsável. – Cara de responsável. – Queria te pedir um favor. É possível? – Já topando, qualquer coisa, menos ir embora da festa. – Você pode vigiar para mim a garrafa de rum da Cuba Libre. Não quero que ninguém fique bêbado. – Pronto, botou o bode para tomar conta do milho.    

Uma pausa na história para um momento cultural. Tanto a cachaça como o rum são destilados obtidos a partir da cana de açúcar.

A principal diferença está no processo de produção, a cachaça é feita com o caldo fresco da cana fermentado e o rum a partir do caldo cozido da cana, o melaço, um subproduto do processo de produção do açúcar.

Essa diferença no processo resulta em distintos aromas e sabores nestas duas bebidas. Outra diferença está na graduação alcoólica estabelecida pela nossa legislação. A cachaça pode ter a entre 38% a 48% de álcool, já o rum de 35% a 54%.

Segundos alguns historiadores o rum surgiu no começo do século XVII nas colônias britânicas do Caribe, provavelmente em Barbados.

Já a cachaça, foi o primeiro destilado das Américas, já era produzida no litoral brasileiro entre 1516-1532. 

Voltando para a festa, posso dizer que cumpri minha missão com zelo e afinco, fiquei “zura” com o rum, só dava um pouquinho a quem pedia, e mesmo assim, só se eu fosse com a cara do cidadão.

Já que eu estava por ali mesmo, ia tomando umas Cubas, cada uma mais forte que a anterior, tanto que no final já pensava: – Qual será o gosto deste negócio puro?

Foi por aí que sofri de um transtorno de processamento sensorial, nome científico para apagão, intervenção do editor da vida, ou branco parcial nas lembranças.

Deste ponto em diante a memória vem em flashes, entrei num liga/desliga, ou como se diz em português clássico, em on/off.

ON – Na festa olhando para uma garrafa vazia de rum.

OFF 

ON – Sentado em um banco no terraço do duplex, para pegar um ar (primeiro remédio sempre recomendado a quem está meio tonto). O pai da aniversariante me ajudando. Ôpa! O pai !! Naqueles tempos pai era sinônimo de encrenca.

OFF

ON – Levantei para dizer ao pai da aniversariante, o dono da casa, que não estava bêbado, no início da explicação (Maurício, meu irmãozinho, presente ao ato, adora esta parte da história), fui rudemente interrompido ao bater com a testa, quase ia dizendo com os chifres, num arame esticado para secar roupas. (apartamento de luxo com arame para esticar roupas?).

OFF

ON – Lava o rosto com água fria. – Alguém sugeria isto enquanto uns 3 me escoravam na porta do banheiro.

OFF

ON – Penetra na festa e dá vexame, fica bêbado e ainda dá trabalho. Resolvi explicar para o autor deste irônico comentário o que estava acontecendo. Tropeçando para cima dele argumentei – Seu babaca, vou te quebrar a cara. Várias mãos me seguraram.

OFF

ON – Café frio com sal, é um santo remédio. Era a empregada da casa, uma santa criatura, tadinha, eu já havia, num ON ou num OFF lá atrás, por um motivo qualquer, a mandado ir à merda. Não queria tomar aquela beberagem. Mesmo bêbado, sabia que café com sal podia ser qualquer coisa, menos um santo remédio.

OFF

ON – Estava bebendo o negócio, com a ajuda dos outros.

OFF

ON – Estava vomitando o negócio, sem a ajuda dos outros.

OFF

ON – Pelado debaixo do chuveiro. – Como é que fiquei pelado?

OFF

ON – Saindo do prédio, já na rua, com todos da minha turma me segurando. –  Como é que fiquei vestido?

Só havia uma certeza no grupo, entre os demais, é claro, eu já não sabia de mais nada, naada… naaaada…. A certeza era de que eu havia estragado a festa deles, sem falar na festa propriamente dita. Eu falei uma certeza? Na verdade eram duas, a outra era de que não haveria meio de me enfiar dentro de um ônibus, voltaríamos de táxi.

OFF

ON – Deitado confortavelmente na calçada, tão quentinha, macia, e o pessoal me puxando para entrar em um carro. Não havia sido fácil conseguir um táxi, todos os 9 anteriores, ao avistarem aquele corpo estendido no chão, haviam refugado em fazer a corrida.

OFF

ON – Tudo rodando, enjoo, táxi balançando, café com sal, Cuba-Libre, janela fechada. Tento pedir desculpas ao motorista por ter sujado seu carro. – Dhixxcurpa, vômitechei no xeu cárru. – O pessoal ajudava, falando no meu ouvido. – Cala a boca! – Fica quieto pô! – O motorista começou a desconfiar que alguma coisa diferente estava acontecendo. – O quê é que ele disse? – Nada não, está te agradecendo por ter parado. Todo mundo falava ao mesmo tempo para disfarçar meus barulhos e pedidos de desculpas. Abre a janela! Janela! Abre a janela! Tá calor! Tá entendendo? Calor!

OFF

ON – A janela já estava aberta, eu limpava a boca com a mão, e limpava a mão no banco do táxi, na minha roupa, nas camisas dos colegas. Confesso que essa parte da história é meio escatológica.

OFF

ON – Já na porta do nosso prédio, Maurício e outros me ajudando a subir a escada da portaria, minhas pernas pareciam ser de macarrão cozido.

OFF

ON – Elevadoooor, suuubinnnduuu, paaarannnduuuu.

OFF

ON – Maurício abrindo a porta, implorando por silêncio, eu meio desmaiado, praticamente carregado no colo, aí abro os olhos, reconheço minha casa e recobrando as forças, me livro dos meus ajudantes, e em agradecimento expulso a todos porta a fora. – NA MINHA CASA NINGUÉM ENTRA!!!!!! – e berrando ainda mais – FALA BAIXO!!!! VÃO ACORDAR A MINHA MÃE!!!!

No dia seguinte acordei morto! Maurício! Te juro, nunca mais vou beber …. Pera aí, jurei errado. Nunca mais vou tomar Cuba Libre!   

Sei que já fiz algumas promessas semelhantes, em outras crises de dessatisfação com as bebidas, um entojo engulhoso que me fazia jurar solenemente sobre garrafas de gin, uísque ou vinho que nunca mais beberia delas, promessas devidamente furadas nas semanas seguintes. Mas a jura da Cuba Libre está firme, já bateu 5 décadas e umas beiradas.

Será que tecnicamente eu poderia chamar esta implicância, que me leva a refugar ante o coquetel, de uma higrofobia específica?

SABEDORIAS E SAPIÊNCIAS

ESTÃO VOLTANDO AS FLORES

Por Alim Amina

Orquídea da Mácita, nossa apoiadora e leitora, cultivada no Natal de 2019 e que refloresceu agora.

É preciso tempo e bondade para se cuidar de plantas. São seres caprichosos que exigem dedicação e observação constante. Não falo de tempo físico – andam dizendo que esse, nosso capataz cotidiano, foi inventado para nos escravizar. Falo do tempo interior, da delicadeza de se entregar a interlocutoras que não falam verbos, mas belezas.

 

De vez em quando uma agradece o nosso empenho com uma florada múltipla, de vivas cores. Que alegria, este dia! De vez em quando peço-lhes, em conversas verdadeiras e diretas que não tardem, que venham as flores para nosso deleite e consolo.

 

Após a terceira dose da vacina, apesar de sabermos que ainda não estamos livres da Pandemia, já dá para respirar um pouco. Posso até sonhar em viajar, com a esperança renovada que passará de sonho, afinal.

 

E sim, esperar as flores que literalmente, e poeticamente, já se anunciam!

 

TIRINHA

SÔNIA VALÉRIA, A CABULOSA

CREPÚSCULO

AS VISTAS

Catadora de histórias, estou sempre atenta às oportunidades de receber mais uma. Outro dia uns amigos de Brasília, exilados em Paris na década de 70, contaram durante um jantar alegre, como sempre são nossos encontros, sobre o vão de sótão alugado por um grupo de camaradas brasileiros e que não tinha janela. Estetas em essência e prática, os jovens em melancolia pintaram uma vista na parede. Na tarde de sexta, cada um nas suas casas, trocamos, eu e minha família, no típico grupo pelo qual nos comunicamos diariamente, fotos das paisagens urbanas de nossas varandas. Foi tanta gratidão que senti que não há palavra na qual caiba!

Obrigada por estarem com a gente até aqui.

Tuty e Trupe