Edição N. 25 - EDIÇÃO ESPECIAL
CONSCIÊNCIA - 29/12/2021
Orquestra

Realização FORA DE SÉRIE percursos culturais.

Edição Geral: Tuty Osório

Textos: Antônio Carlos Queiroz, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Miguel Boaventura, Sarah Coelho, Tuty Osório,  Jô de Paula, Sérgio Pires, Francisco Bento, Renato Lui, Marta Viana, Alim Amina, Lia Raposo, Mila Marques, Yvonne Miller

Fotografia: Celso Oliveira, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Fernando Carvalho

Edição de Fotografia: Manuela Marques 

Projeto Gráfico e Diagramação: Manuela Marques com consultoria de Fernando Brito.

Ilustrações e Quadrinhos: Manuela Marques, Mário Sanders, Alice Bittencourt.

Revisão: Camilla Osório de Castro.

Mídias sociais: Beatriz Lustosa.

Desenvolvimento de Site: Raphael Mirai.

 
ALVORADA

A ALMA E A GENTE

foto: Celso Oliveira

Havia uma série documental que eu assistia com meu pai, na TV portuguesa. Falava da história de Portugal, do encontro com o Brasil. O nome do pesquisador era José Hermano Saraiva, já idoso nesse tempo, um conhecedor dos fatos, emocionado pelos significados, cultuador do passado como mapa do presente e do futuro. Era um caminho de autoconhecimento, de estar consigo ao saber das complexas ancestralidades. Foi quando cogitei que a alma é a essência, em sentido literal e transcendental. Naquilo que nos é conhecido e desconhecido. O novo ano aproxima-se, praticamente chegou e falam em Saúde Mental, Espiritualidade e Cura. Dizem que são tendências nas sociedades e seus templos corporativos – as empresas. Pensando na vida parece bem importante dar atenção, sim, a essas três dimensões, muito faladas, mas muito distorcidas. Esta edição especial é um esboço sobre. Para fecharmos 2021 com essa abelhinha zunindo. Para nos morder sem doer. E até salvar. 

Começa agora mais um Domingo à NOITE em 2021! 

CONTO

O MÉDICO DAS ESTRELAS

por Tuty Osório

foto: Celso Oliveira

– Você é contra remédios mãe?

– Que ideia filha!! Onde você foi buscar isso?

– Mãe! Você vive falando isso, aos quatro ventos, aliás tempestades!!É um assunto que te deixa bastante alterada.

– Bom. É. Eu não gosto de nada que engane sintomas, iluda cura, em especial quando se trata de sentimentos. Uma coisa são dificuldades que precisam ser controladas com medicação. Outra coisa é essa onda de se alienar com antidepressivos à primeira angústia. Não conseguir passar por uma gripe sem antivirais pesados. Tomar antibiótico a qualquer inflamação. É meio isso…

– E os médicos são rápidos nessa receita, né?

– Nem todos. Pelo menos um não é assim. Aposta na vontade, na vitória da consciência sobre a fuga. É preciso coragem…

– Do paciente?

– Do médico também. É preciso confiar na autoconfiança para poder inspirar autoconfiança nos outros.

– Bacana, mamãe. Obrigada!

– Pelo quê?

– Sei lá. Só gostei.

– É muita responsabilidade receber gratidão. Mas quando a gente é mãe…e médico, não tem jeito. Obrigada, também, filha.

CRÔNICA

A AGÊNCIA DE PAPAIS NOÉIS

Por Yvonne Miller

Eu tinha 6 anos e a existência do Papai Noel era um fato. Nunca teria passado por minha cabeça desconfiar daquele homem sorridente de sobretudo vermelho que todo 24 de dezembro à tarde fazia ato de presença na casa dos meus avós. Era só a gente recitar direitinho um poema, contar uma história de Natal ou entoar “Leise rieselt der Schnee” na flauta e… ding dong! Lá estava ele, tocando a campainha, com o saco cheio de presentes sobre o ombro. Aquele homem tão parecido – se não fosse pela barba comprida e macia – com meu avô que, curiosamente, nunca podia passar o Natal com a gente…

 

Apesar da minha certeza sobre a existência do Papai Noel, na escola havia certos boatos. Alguns diziam que era tudo uma grande mentira, outros chamavam de invenção capitalista e mais outros espalhavam uma ousada teoria: existiria uma “agência” que pagava estudantes universitários para visitarem as famílias no Natal, fantasiados de Papai Noel.

— Ô besteira! — respondi à Lina, que me contou da absurda teoria durante o intervalo, num dezembro cinzento e frio.

 

Poucos dias depois o telefone de casa tocou. Era o mesmo ano que meus avós iam viajar, e meus pais, minha irmã e eu íamos passar Natal só entre nós. Eu cheguei primeiro e atendi:

— Yvonne Miller, boa tarde?

Do outro lado, uma voz masculina com sotaque polonês:

— Senhora Miller, meu nome é Barthek, o Papai Noel da a…

Neste momento minha mãe arrancou o telefone da minha mão:

— Para seu quarto, mocinha, agora!

 

Cinco minutos mais tarde, ela bateu na minha porta. Uma expressão meio preocupada no rosto, voz meiga:

— Filha, você já é grande e pode saber. Mas não conta nada pra sua irmã, tá bom?

Assenti com a cabeça sem entender do que ela estava falando. E, de fato, eu não estava nem aí: revolvia a mochila da escola em busca da lista com os telefones da minha turma. Achei, voltei à sala e disquei o número da Lina:

— Era besteira mesmo, viu? O Papai Noel acabou de me ligar. Seu nome verdadeiro é Barthek e é polonês!

Toda me sentindo, desliguei o telefone e fui praticar flauta.

 

 

 

TRILHA

 

Yvonne Miller (Instagran) (Crônicas por Yvonne Miller)

 

Quando a Maré encher – contos cearenses(livro), por Yvonne Miller, Beatriz França, Josi Siqueira, Kah Dantas, Liliana Ripardo, Luciana Targino, Marta Viana, Monica Silveira, Zélia Sales

Em https://abacashi.com/p/quando-a-mare-encher

SABEDORIAS E SAPIÊNCIAS

EXPERIMENTA O TEU MOLHO DE CHAVES

Por Alim Amina

Um dos autores que mais aprecio é Érico Veríssimo. São muitas as obras que gosto e que me marcaram em épocas diversas. Olhai os lírios do campo, nos tempos de estudante secundarista, lido às escondidas por supostamente conter comportamentos avançados para os anos 50 da minha adolescência. Publicado em 1938, foi classificado como um romance urbano. Conta sobre ambição, abandono, lealdade e culpa.

 

Culpa não é bom sentimento. A verdadeira liberdade está em jamais termos motivos para senti-la. Deveríamos ter essa prática, de não alimentar culpas, não magoar para não as fazer nascer, desde bem pequenos. Deveria fazer parte da educação.

 

Despedi-me de alguns afetos em vida.

 

Porque não me suportaram ou porque não os pude suportar. Suportar, não somente o peso. Homenageando o livro de Millan Kundera, a leveza também é passível de ser insuportável.

MÚSICA

Banda daSilva - “Odara” (Caetano Veloso)

BACHIANAS E COMPANHIA

ESPAÇO E TEMPO

Por Francisco Bento

via Celso Oliveira

Aqui para a celebração de boa comida, boa bebida, boas emoções. Alimentos do corpo e da alma. Já ficamos nostálgicos pelos tempos inocentes. Tristes pela fome de nossos irmãos e irmãs que estão à nossa porta e pelos quatro cantos do mundo. Também contamos belas histórias. As do Sérgio Pires são incomparáveis. Como ele é mestre no festejar!!

 

Hoje vamos falar de jejum como busca. Imitando faquir em meditação. Muitos de vocês sabem que o jejum não é uma prática de uma única religião. Muitas recorrem a esse estado de corpo para melhor alcançar a alma em seus esconderijos.

 

Não sei se é real, porque nunca pratiquei o jejum como filosofia ou estratégia de recolhimento. Desconfio que o vazio no estômago, quando voluntário, pode sim, dar margem à lucidez interior.

 

Não apenas o jejum literal. Também como metáfora. O vulgo ficar na sua para retornar enxergando mais a do outro.

CREPÚSCULO

A ALMA DE ÍCARO

“Eu tinha umas asas brancas.

Asas que um anjo me deu.

Em me eu cansando da terra, batia-as, voava ao céu.”

 

Estes versos, do poeta português Almeida Garret, foram-me ensinados em criança, para dizer nos encontros de família. Eu gostava desse papel de intérprete, de pequena animadora de adultos deleitados pela minha engraçadinha performance. Meus pais adoravam e alimentavam a minha receptividade à poesia e foi assim que dei os primeiros passos num ensaio do que nunca fiz. Interpretar profissionalmente. Hoje compreendo que podemos fazer muitas coisas, com dedicação e prazer, sem ser obrigatoriamente um trabalho. Nem uma missão. É possível vestir as asas, sempre que a gente desejar. É melhor com sinceridade e alegria.

Obrigada por estarem com a gente até aqui.

Tuty e Trupe