Edição N. 09 - 12/09/2021
Orquestra

Realização FORA DE SÉRIE percursos culturais.

Textos: Antônio Carlos Queiroz, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Miguel Boaventura, Sarah Coelho, Tuty Osório, Ana Karla Dubiela, Jô de Paula, Sérgio Pires, Francisco Bento.

Fotografia: Celso Oliveira, Camilla Osório de Castro, Manuela Marques, Fernando Carvalho

Projeto Gráfico e Diagramação: Manuela Marques com consultoria de Fernando Brito.

Ilustrações e Quadrinhos: Manuela Marques, Mário Sanders, Alice Bittencourt

Revisão: Camilla Osório de Castro.

Mídias sociais: Beatriz Lustosa.

Desenvolvimento de Site: Raphael Mirai

 
ALVORADA

JANGADA DE PEDRA

Há muito mais dúvidas que certezas no ar. Por contraditório que pareça a dúvida é mais segura porque busca a luz. De nada adianta o filósofo buscar o relógio perdido debaixo do lampião de gás se não foi lá que o perdeu. Se é no escuro que o medidor do tempo está, há que conseguir uma lamparina. Ou aguardar o dia. Pois que o dia não se faz por nossa obra. Virá e estará em nós saber passar quando chegar. Mesmo insones da noite varada. Trêmulos da vara desarvorada sobre nossas almas. Mesmo assim, seremos capazes de fincar sobre o chão a estaca que nos projetará a novas raízes.

 

NÓS juntos, criadores e leitores, do Domingo à NOITE em 2021

POESIA

Passagem das Horas

por Álvaro de Campos

Sentir tudo de todas as maneiras,

Ter todas as opiniões,

Ser sincero contradizendo-se a cada minuto,

Desagradar a si-próprio pela plena liberalidade de espírito,

E amar as coisas como Deus.

 

Eu, que sou mais irmão de uma árvore que de um operário,

Eu, que sinto mais a dor suposta do mar ao bater na praia

Que a dor real das crianças em quem batem

(Ah, como isto deve ser falso, pobres crianças em quem batem —

E porque é que as minhas sensações se revezam tão depressa?)

Eu, enfim, que sou um diálogo contínuo

Um falar-alto incompreensível, alta-noite na torre,

Quando os sinos oscilam vagamente sem que mão lhes toque

E faz pena saber que há vida que viver amanhã.

Eu, enfim, literalmente eu,

E eu metaforicamente também,

Eu, o poeta sensacionista, enviado do Acaso

 

Às leis irrepreensíveis da Vida,

Eu, o fumador de cigarros por profissão adequada,

O indivíduo que fuma ópio, que toma absinto, mas que, enfim,

Prefere pensar em fumar ópio a fumá-lo

E acha mais seu olhar para o absinto a beber que bebê-lo…

Eu, este degenerado superior sem arquivos na alma,

Sem personalidade com valor declarado,

Eu, o investigador solene das coisas fúteis,

era capaz de ir viver na Sibéria só por embirrar com isso

E que acho que não faz mal não ligar importância à pátria

Porque não tenho raiz, como uma árvore, e portanto não tenho raiz…

Eu, que tantas vezes me sinto tão real como uma metáfora,

Como uma frase escrita por um doente no livro da rapariga que encontrou no terraço,

Ou uma partida de xadrez no convés dum transatlântico,

Eu, a ama que empurra os perambulators em todos os jardins públicos,

Eu, o polícia que a olha, parado para trás na álea,

Eu, a criança no carro, que acena à sua inconsciência lúcida com um colar com guizos,

Eu, a paisagem por detrás disto tudo, a paz citadina

Coada através das árvores do jardim público,

Eu, o que os espera a todos em casa,

Eu, o que eles encontram na rua

Eu, o que eles não sabem de si-próprios,

Eu, aquela coisa em que estás pensando e te marca esse sorriso,

Eu, o contraditório, o fictício, o aranzel, a espuma,

O cartaz posto agora, as ancas da francesa, o olhar do padre,

O lugar onde se encontram as duas ruas e os chauffeurs dormem contra os carros,

A cicatriz do sargento mal-encarado,

O sebo na gola do explicador doente que volta para casa,

A chávena que era por onde o pequenito que morreu bebia sempre,

E tem uma falha na asa (e tudo isto cabe num coração de mãe e enche-o)…

Eu, o ditado de francês da pequenita que mexe nas ligas,

Eu, os pés que se tocam por baixo do bridge sob o lustre,

Eu, a carta escondida, o calor do lenço, a sacada com a janela entreaberta,

O portão de serviço onde a criada fala com os desejos do primo,

O sacana do José que prometeu vir e não veio

E a gente tinha uma partida para lhe fazer…

Eu, tudo isto, e além disto o resto do mundo…

Tanta coisa, as portas que se abrem, e a razão porque elas se abrem,

E as coisas que já fizeram as mãos que abrem as portas…

Eu, a infelicidade-nata de todas as expressões,

A impossibilidade de exprimir todos os sentimentos,

Sem que haja uma lápide no cemitério para o irmão de tudo isto,

E o que parece não querer dizer nada sempre quer dizer qualquer coisa…

Sim, eu, o engenheiro naval que sou supersticioso como uma camponesa madrinha,

E uso o monóculo para não parecer igual à ideia real que faço de mim,

Que levo às vezes três horas a vestir-me e nem por isso acho isso natural,

Mas acho-o metafísico e se me batem à porta zango-me,

Não tanto por me interromperem a gravata como por ficar sabendo que há a vida…

Sim, enfim, eu o destinatário das cartas lacradas,

O baú das iniciais gastas,

A intonação das vozes que nunca ouviremos mais —

Deus guarda isso tudo no Mistério, e às vezes sentimo-lo

E a vida pesa de repente e faz muito frio mais perto que o corpo.

A Brígida prima da minha tia,

O general em que elas falavam — general quando elas eram pequenas,

E a vida era guerra civil a todas as esquinas…

Vive le mélodrame où Margot a pleuré!

Caem folhas secas no chão irregularmente,

Mas o facto é que sempre é outono no outono,

E o inverno vem depois fatalmente,

E há só um caminho para a vida, que é a vida…

 

Esse velho insignificante, mas que ainda conheceu os românticos

Esse opúsculo político do tempo das revoluções constitucionais,

E a dor que tudo isso deixa, sem que se saiba a razão

Nem haja para chorar tudo mais razão que senti-lo.

 

Todos os amantes beijaram-se na minha alma,

Todos os vadios dormiram um momento em cima de mim

Todos os desprezados encostaram-se um momento ao meu ombro,

Atravessaram a rua, ao meu braço todos os velhos e os doentes,

E houve um segredo que me disseram todos os assassinos.

 

(Aquela cujo sorriso sugere a paz que eu não tenho,

Em cujo baixar-de-olhos há uma paisagem da Holanda,

Com as cabeças femininas coiffées de lin

E todo o esforço quotidiano de um povo pacífico e limpo…

Aquela que é o anel deixado em cima da cómoda,

E a fita entalada com o fechar da gaveta,

Fita cor-de-rosa, não gosto da cor mas da fita entalada,

Assim como não gosto da vida, mas gosto de senti-la…

Dormir como um cão corrido no caminho, ao sol,

Definitivamente para todo o resto do Universo,

E que os carros me passem por cima)

 

Fui para a cama com todos os sentimentos,

Fui souteneur de todas as emoções,

Pagaram-me bebidas todos os acasos das sensações,

Troquei olhares com todos os motivos de agir,

Estive mão em mão com todos os impulsos para partir,

Febre imensa das horas!

Angústia da forja das emoções!

Raiva, espuma, a imensidão que não cabe no meu lenço,

A cadela a uivar de noite,

O tanque da quinta a passear à roda da minha insónia

O bosque como foi à tarde, quando lá passeamos, a rosa,

A madeixa indiferente, o musgo, os pinheiros,

Toda a raiva de não conter isto tudo, de não deter isto tudo,

Ó fome abstracta das coisas, cio impotente dos momentos,

Orgia intelectual de sentir a vida!

 

Obter tudo por suficiência divina —

As vésperas, os consentimentos, os avisos,

As coisas belas da vida —

O talento, a virtude, a impunidade,

A tendência para acompanhar os outros a casa,

A situação de passageiro,

A conveniência em embarcar lá para ter lugar,

E falta sempre uma coisa, um copo, uma brisa, uma frase,

E a vida dói quanto mais se goza e quanto mais se inventa.

 

Poder rir, rir, rir despejadamente,

Rir como um copo entornado,

Absolutamente doido só por sentir,

Absolutamente roto por me roçar contra as coisas,

Ferido na boca por morder coisas,

Com as unhas em sangue por me agarrar a coisas,

E depois dêem-me a cela que quiserem que eu me lembrarei da vida.

Florifagia

por Alice Bittencourt

tenho o desejo de comer flores.
toda vez que eu vejo uma farta flor em botão,
rosas, girassóis, margaridas –
uma parte de mim se inibe de devorá-las.
canibalista e autofágica,
quero mastigar a criação do mundo.
quero engolir meus livros, minhas telas,
meus cactos, minhas tintas.
talvez, se conseguir digerir
os estudos de Klimt,
consiga desenhar algo que julgo decente
em antrofagia quase erótica,
quero pintar pessoas comendo flores;
mãos e bocas apenas.
não yônicas e vulvares,
mas gordas de pétalas, redondas
em seu cálice
a toda planta que semeio saliva-me a boca.

REPORTAGEM ENSAIO

NÃO DEVORARÁS!

por Miguel Boaventura

foto: Celso Oliveira

Havia uma desconfiança, muitos de nós negamos e quando o coreano Byung-Chul Han, radicado na Alemanha, escreveu a Sociedade do Cansaço, os próceres intelectuais despertaram para o óbvio. O Sistema, seja ele qual for e por quem quer que seja comandado, está destruindo a nossa vitalidade. No limite, somos zumbis com, ou sem, medalhas de mérito. Despossuídos de honra, perdemos o rumo de quem realmente somos.

 

Quem tem contratos de trabalho é abusado por sobrecarga de responsabilidades, acossado pelo pânico de perder o emprego. Os autônomos, empreendedores de si mesmos, os entregadores de comida ou os criadores dos Aplicativos, são escravizados pelo terror de perder cada minuto de oportunidade de renda.

 

Todos aterrorizados pela ameaça do looping, da miséria, de acabar a comer sopa de osso junto à fogueirinha de papel, nas noites frias. Ou sopa de sobras nas filas da caridade. Não é caricatura, a classe média está ameaçada e pela primeira vez, sem ver saída, realmente, chora.

 

As empresas oferecem home office para liberar tempo. Meditação corporativa para liberar tensão. Ginástica laboral para preservar o Corpo- Caixa que amofina a alma. Tudo isso para te manter um sujeito produtivo, com sua identidade produtiva preservada, o cansaço como charme contemporâneo, as redes virtuais – ditas sociais – ditando que você se desdobre 7 (dias) sobre 24 (horas) – sob pena de deixar de existir.

 

E aí talento é engajamento. Dedicação é algoritmo. Espelho é filtro. Será mesmo? Está lançado o debate, a caldeirada de incômodos do pensar, a briga do que há de mais eterno – a consciência; com o que há de mais moderno – a aparência.

 

TRILHAS

 

Aparências, música de Márcio Greick, por Belchior na interpretação mais linda, Youtube Music, Spotfy, e mais

 

Filosofia do Zen Budismo, livro, por Byung -Chul Han, Editora Vozes

 

Vibes do Trabalho, uma narrativa sobre os sentidos do trabalho, por Float, site na internet (interseção de estratégia, produção de conteúdo e experiências de aprendizado)

CONTO

CONTÁGIO DO BEM

por Tuty Osório

foto: galeria pessoal

– Chega aqui, filha, a Florbela tá passando mal!

-O que foi mãe?

-Aquelas crises de ansiedade dela! Parece que vai enfartar!

-Vem aqui Florinha! Ô meu Deus! A bichinha!

-Está ficando velhinha a nossa Shitzu!

-É mesmo mamãe. Ela está com 10 anos, quase.

-Passando mal que nem quando era filhote! Lembra?

-Fica tranquila Florinha! Fica aqui no colo!

-Leva ela pra ficar com você no quarto.

-Acho que é essa bagunça dos vizinhos aí do outro prédio. Muito barulho. Grito, música alta!

-Mas filha, é sábado. As pessoas querem se divertir e é em casa mesmo o lugar bom de fazer isso…

-Mas mãe, sem perturbar os outros, né? Olha aí como a Florbela ficou?

-Quer saber? Tenho pra mim que ela passou mal porque queria mesmo era se juntar na farra deles…

– Oi???

-É filha. Alegria! Nem é aglomerado. São alguns familiares na piscina. Tá pesado filha. Se tem gente se divertindo, a gente tem que achar bom. E explicar pra Florbela que ela é um cachorro e não foi convidada. Mas pode curtir daqui…

-Cê tá dizendo, né mãe??!!! 

CRÔNICA

SOMBRAS DE BURITIS

Por Tuty Osório

fotos: Fernando Carvalho

Nunca tinha prestado atenção. Foi em 1995 quando me mudei para Brasília que aquelas árvores tortinhas se apresentaram. A baixa umidade. O sol inclemente, que para quem tinha passado a infância em Moçambique e a adolescência no Ceará parecia familiar. Qual! O amigo Azul, cearense como eu, num dos meus pertencimentos, me avisou que aquele solão atravessado no verde matizado não era pra brincar. Confiei.

 

Um outro cearense me mostraria com detalhe o Cerrado urbano, rural, as Águas Emendadas, as nascentes dos Rios que iam crescer e desaguar em Minas, na Bahia, na Amazônia. Assim está na minha lembrança como evidência. Francisco Dantas, o Chico Floresta, engenheiro florestal, sindicalista, militante, ativista. Sua companheira Sandra convidou-me a escrever sobre o tema nas redes sociais da época – Jornais Temáticos, Folhetos, Panfletos, Falações.

 

Foi uma oficina de consciência ambiental em caráter de urgência, sem currículo de aulas pré-definido. Com Sandra e Chico aprendi a conhecer e a amar o Cerrado que tem, sacramentado, um dia instituído como sua data nacional – 11 de setembro.

 

Espalhado pelo Centro Oeste, Sudeste, Norte e Nordeste, o Cerrado ocupa, aproximadamente, 22% do território brasileiro e é o segundo maior bioma da América Latina, depois da Amazônia. Por décadas foi deixado em segundo plano, como se de crime não se tratasse desmatá-lo, queimá-lo. Até que despertamos e, pra variar nada, tentamos correr atrás do horrendo prejuízo.

 

Amazônia, queridinha do mundo, famosa internacionalmente, já é babado demais! Aí vem Mata Atlântica, da qual restam rasgões diminutos. Incluindo a Serra de Guaramiranga, lindeza cearense, encravada entre o mar e o sertão, um reduto ameaçado pela especulação imobiliária.

 

 Daí vem o Cerradão com carinha de Savana Africana, só que não, mais um Brasil que grita. E não se cansem que ainda tem Caatinga, Restinga, Mangue…Eita paisinho pra dar trabalho! Abençoado como as crianças travessas do sertão de antigamente…

O BEM VIVER

PROCURA-SE UM AVATAR

por Camilla Osório de Castro

 

foto: Reprodução

Com três temporadas, a série foi veiculada em todo o mundo entre 2005 e 2008, embalando as tardes de quem, como eu, foi criança nesse período. Avatar, a lenda de Aang é um seriado infantil para televisão criado por Michael Dante Dimartino e Brian Konietzko.  Produzido pela Nickelodeon.

 

Revisitando a obra para uma pesquisa esta semana, não pude deixar de notar o quão pertinente ela é para pensar os desafios da contemporaneidade. 

 

O universo ficcional nos apresenta um mundo dividido em quatro nações: Ar, Água, Terra e Fogo. Em cada um desses reinos existem pessoas com habilidades especiais de manipular esses elementos, de forma mágica.

 

O Avatar é aquele capaz de manipular os quatro elementos, mantendo assim o equilíbrio do mundo.

 

A história inicia-se com esse equilíbrio maculado por uma guerra deflagrada pela Nação do Fogo que se aproveita do desaparecimento do Avatar para dominar os povos vizinhos. A partir de então, acompanharemos a saga de Aang, o jovem Avatar que esteve 100 anos congelado e retorna a um mundo destruído por sua ausência. Tudo o que ele conhecia morreu e agora é imperativo aprender a conhecer e a dominar suas habilidades. Sobreviver e ajudar a salvar o que restou.

 

Há muito a esmiuçar. Pretendo tratar aqui do mais pertinente para o nosso tema de sempre: os caminhos de um Bem Viver possível, concreto, sem magia e sem um Avatar para nos salvar.

 

A Nação do Fogo representa, em Avatar, um progresso que leva à destruição. O mesmo fogo que é potência de vida, criação, calor, paixão, é impulsionado pela soberba a construir a guerra. O que a Nação do Fogo faz com as outras é o que chamamos, no nosso real – Imperialismo.

 

Há uma aniquilação do outro que acontece de modo mais imediato pelos assassinatos ocorridos nas invasões dos territórios alheios. E, a longo prazo, pela aniquilação simbólica através de trabalhos forçados, impostos abusivos e a proibição de exercer cada Cultura.

 

Com o tempo, os membros das nações dominadas vão perdendo a noção de quem são e de quem podem ser. A Nação do Fogo não precisa mais fazer o esforço de matá-los, podendo sugar suas energias por inteiro sem que consigam reagir.

 

A jornada de Aang para tornar-se habilidoso nos quatro elementos, a ponto de conseguir reverter essa situação de Terra Arrasada, aponta para dois caminhos principais.

 

Em primeiro lugar, temos o resgate da sabedoria ancestral de cada povo. Cada nação tem algum valor a ensinar ao Avatar para que ele possa dominar seu elemento; e esses valores tornam-se fortalezas para que essas nações reajam ao opressor – uma expressão veemente é o  episódio Aprisionados. Uma rebelião de prisioneiros que dominam o elemento da Terra. Rebelião motivada por sua reconexão com a firmeza, consistência e honra.

 

Em segundo lugar, a própria existência do Avatar como protagonista da história, e catalizador das forças da natureza, para a neutralização do opressor. Voltando o nosso olhar para a estrutura do nosso planeta, que é anterior a nós, enquanto espécie.

 

A natureza sempre busca o equilíbrio. Em 2021 o desequilíbrio que nossa faceta, Brasil, – de Nação do Fogo -, vem causando, é evidente.

 

Como também evidentes são os movimentos da natureza para se reestruturar, se reerguer, apesar de tudo.

 

No episódio Mundo Espiritual, Aang precisa acalmar o espírito da floresta que, ferido por sua destruição, promovida pela Nação do Fogo, ataca todas as noites o vilarejo ao redor, tragando seus moradores.

 

A metáfora tem muito a nos dizer. Do nosso Aqui e Agora.

 

É incontestavelmente bonito falar com as crianças sobre guerra, destruição, perdas e cegueira por Poder, de modo lúdico e mágico.

 

A interação de Aang com o espírito da floresta termina com um gesto de esperança: Aang pega uma das muitas sementes que estão espalhadas, dizendo, “ele vai voltar”.

 

Aang faz essa afirmação com a segurança de ser ele o Avatar, o agente do equilíbrio, aquele que pode barrar a destruição. 

 

O convite de hoje é para artesanar um movimento de Avatar. O que deverá ser um esforço coletivo.

 

Não haverá um herói para nos salvar de nossas guerras. Cada um e todos juntos seremos essa força motriz de mudança.

 

TRILHA

Avatar, a Lenda de Aang (2005 a 2008), série produzida por Nickelodeon Productions e DR Movies. 3 temporadas. Disponível na Netflix

 

Os Condenados da Terra (1961), livro por Frantz Fanon

BACHIANAS E COMPANHIA

PANCS PUNKS

Por Francisco Bento

foto: Divulgação

Sou um senhor de chapéu panamá, sapatilhas lacoste, bermuda de brim e camisa listrada de algodão grosso, porém fresquinho para o calor do verão. Moro em Santa Teresa, no Rio de Janeiro sempre lindo. Não me desapego, tenho meu cafofo num predinho antigo conservado, o bairro virou turismo, fico bem aqui. Vim do Ceará nos 70, com a leva de jovens buscando arte e academia num tempo que o Rio era uma Meca. Continuo defendendo que o Rio é básico, luxo e sobrevivência. 

 

Ganhei dinheiro na noite, no dia, no balanço e no palpite. Fui dono de bar, restaurante, boate, casa de show. Juro que nunca, desonesto. Atento às oportunidades, sem dúvida. Aposentei faz uns anos, sem saco de continuar sendo gente por obrigação. Optei por sair da bolha só quando está favorável. E assim navego.

 

Fiquei sabendo pela Tuty Osório que o Sergio Pires é carioca. Vou convidá-lo pra tomar uma Bagaceira Velha tirada de gosto com chouriço assado no álcool, dia desses, no terracinho daqui de casa. Raízes da mesma coluna, acho que vai ser bacana demais a gente se conhecer. Tuty Osório ficou de promover a troca de whatsapps.

 

Justificativas feitas, muita enrolação pra variar, vou pro objeto desta participação.

Ocorreu que outro dia fui convidado para uma Jornada sobre PANCS – Plantas Alimentícias Não Convencionais e fiquei passado com o que aprendi. Fui coberto pelo manto do preconceituoso condescendente – vamos ver o que essa treta tem pra oferecer…E saí escondido no manto da vergonha e da ignorância. Que bom que a turma lá da Jornada foi generosa com este ridículo conservador.

 

Aprendi eu, que a Rúcula, figurinha assimilada nos pratos mais metidos à besta, já foi considerada uma planta invasora, há um tempo atrás. Aprendi, também, que o Brasil é riquíssimo em PANCS, já catalogadas, publicadas em livros, adotadas por chefes do maior talento, esperando divulgação, assimilação e reconhecimento. Abençoada a hora que venci meu pedantismo imbecil e fui lá apreciar.

 

Deixo aqui a provocação. Vamos conhecer, flertar e amar muito as PUNCS. Algumas vocês até já conhecem e já experimentaram.

 

Senão, vejamos:*

Ora-pro-nobis

Usada como cerca viva e encontrada facilmente no estado de Minas Gerais, a planta é uma ótima fonte de fibras, proteínas e vitaminas. Ela auxilia no funcionamento intestinal e fortalece o sistema imunológico, promovendo saciedade e combatendo os radicais livres, que podem implicar em futuras doenças.

Com alto teor de proteína — aproximadamente 25% de sua composição —, as folhas e o caule da ora-pro-nobis podem ser consumidos em saladas, refogados, omeletes, massas e sucos.

Beldroega

Facilmente confundida com “mato”, a beldroega é uma das PANCs mais comuns, consagrada por seus usos medicinais. Suculenta e rasteira, a planta apresenta pequenas flores amarelas e pode ser consumida cozida ou crua.

Além de ser uma rica fonte de ômega-3, recomendada para problemas cardiovasculares, apresenta propriedades diuréticas, analgésicas e anti-glicêmicas, fazendo jus ao seu famoso poder curativo.

 

Taioba

Também chamada de orelha de elefante por conta do formato de suas folhas, a taioba é uma das plantas ideais para tornar o cardápio mais nutritivo.

Dentre os diversos benefícios que seu consumo apresenta, estão a melhora da visão, combate a prisão de ventre, fortalecimento do sistema imunológico e prevenção de anemia e osteoporose.

 

Peixinho

Também conhecida como lambari da horta, a planta é muito utilizada na decoração e na culinária. Suculenta e de cor verde-prateada, a PANC atua contra a tosse e irritações da faringe, além de apresentar ação microbiana e emoliente, amaciando e suavizando a pele.

peixinho da terra pode ser servido frito ou empanado, em pratos elaborados ou como petisco.

 

Folhas da batata doce

As batatas doces estão sempre presentes nas refeições do dia a dia. Mas você sabia que suas folhas são ricas fontes de nutrientes e antioxidantes? Quando cruas, podem ser tóxicas, mas refogadas, são totalmente seguras e saborosas. Elas apresentam ação anti-inflamatória, diminuindo o inchaço e auxiliando na perda de peso. Além disso, as proteínas presentes na folha ajudam a prolongar a saciedade, sendo ótima opção para tratamentos de compulsão alimentar.

 

Trapoeraba

A trapoeraba é uma planta alimentícia também muito confundida com erva daninha, por não necessitar de um solo rico para se desenvolver.De folhas e caules roxos, apresentam pequenas flores roxas, rosas ou azuladas, e são ricas em fibras e proteínas, com funções diuréticas, anti-inflamatórias e anti-reumáticas. Pode ser consumida em saladas, ensopados e refogados ou em forma de chá, eliminando as toxinas do organismo.

 

Azedinha

azedinha, também chamada de erva-vinagreira, é uma das PANCS mais famosas dentre os entusiastas da dieta Plant Based. Como seu nome já diz, apresenta um sabor ácido característico e pode ser consumida tanto crua quanto cozida, em sucos, saladas, refogados, massas e sopas. Altamente nutritiva, a planta é fácil de ser cultivada mas não deve ser consumida em grandes quantidades, pois possui uma alta concentração de ácido oxálico.

*Site Plantei você colhe o que planta

 

TIRINHA

Benjamin Augusto, o pragmático

CREPÚSCULO

TANTO MAR

Quando eu era criança flanava nos telhados das casas em volta do pequeno prédio da minha avó na cidade do Porto, em Portugal. Pulava de telha em telha, tomando cuidado pra não quebrar nenhuma. Pra não cair e quebrar uma perna. Brincava com os gatos de rua, com as crianças da vizinhança sem saber de classe, sequer de nome. Éramos uma comunidade de pequenos piratas atrás dos tesouros escondidos nas casas abandonadas. Numa delas, havia nascido meu pai. Quando entrava lá, perambulando cuidadosamente entre as madeiras carcomidas, imaginava aquele ano de 1935. Sete anos depois ele acompanhando minha avó, agarrado à mão dela, nas filas do racionamento da Segunda Guerra. Com meu pai atravessei o oceano duas vezes. Em busca de Paz. Quantas guerras ainda teremos que lutar?

  

Obrigada por estarem com a gente até aqui.

Tuty e Trupe